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Subir aos céus - Frei Bento

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1Subir aos céus - Frei Bento Empty Subir aos céus - Frei Bento Dom 4 maio - 15:17

Maria





Subir aos céusFrei Bento Domingues O.P. - 20080504

A linguagem das transformações espirituais da existência não se lê nem se interpreta com um dicionário1.O biólogo Francisco José Ayala, membro da Academia Nacional da Ciência dos EUA, tem dedicado a sua vida ao estudo da evolução. Para ele, religião e ciência não são inimigas. Ao apresentar, em Espanha, o seu último livro (1), o jornal El Mundo fez-lhe algumas perguntas. As suas respostas interessam. A primeira pergunta é daquelas que aparecem sempre nestas circunstâncias: será possível conciliar religião e ciência? A resposta também já se tornou um lugar-comum entre os que não gostam de cultivar confusões: religião e ciência tratam de coisas distintas. Perante o debate público, que irrompeu nos EUA em 1991, sobre o chamado "Desígnio Inteligente" (2), F. Ayala não se contenta em dizer que são coisas distintas. Para ele, os que propõem o "Desígnio Inteligente" são, precisamente, os que vão contra Deus porque procuram usar a ciência para demonstrar a sua existência. Além disso, se essa teoria estivesse certa, seria uma blasfémia. Implicaria que Deus é incompetente porque desenha mal as coisas e, por outro lado, é cruel, pois cria predadores. Por exemplo, o nosso olho é mais deficiente do que o dos polvos. Será que Deus tem mais apreço pelos polvos do que pelos humanos?

Quando lhe perguntam se há cientistas crentes, responde que isso não é incompatível. Um Deus pessoal, como nas religiões monoteístas, está presente em todos os indivíduos. Isso não significa que nos desenha, mas que nos inspira valores morais. Há uma escola de teologia evolutiva que sustenta que a presença de Deus também evolui. O entrevistador insiste: não terá a religião surgido como resposta a enigmas sem resposta que a ciência vai solucionando? Para F. Ayala, a religião nasce de uma necessidade biológica dos humanos, pela consciência da existência e pela consciência de que vamos morrer. Há uma inclinação para a angústia e isso leva ao enterro dos mortos e à necessidade de acreditar em algo transcendental, como Deus. Nasce também como resposta aos enigmas da vida que se vão resolvendo e, sob esse aspecto, o papel da religião vai diminuindo. A ciência, porém, não é solução para o problema existencial e é este que nos faz crer na vida do além.

A vida do além implica a existência de uma alma imortal? Resposta do biólogo: a ciência não pode responder. Isso é algo espiritual e a ciência fala de processos naturais. Aliás, sobre a mente, sabemos que o cérebro existe, como comunicam os neurónios, mas não como se convertem esses sinais eléctricos em ideias e sentimentos, nem como chegamos a ter consciência pessoal. Não quero, por essa razão, fixar a ideia de alma na mente. O entrevistador veio logo com uma resposta: a religião diz que a existência tem um sentido e a ciência diz que a evolução foi fruto de adaptações e mutações. O biólogo acrescenta: sim, houve mutações. No entanto, a evolução não é fruto do azar, mas da selecção natural. Somos uma espécie entre milhões. Todavia, a ciência não nos diz para onde vamos. A religião dá sentido à vida.

2.Se a religião dá sentido à vida, as expressões desse sentido serão plurais. As religiões são diferentes. Aqui, interessa-me destacar um dos aspectos que a convicção cristã assume neste Domingo da Ascensão de Cristo aos Céus. Se a abordagem da fé não é a da ciência, é de boa higiene mental partir do princípio de que não estamos a falar de um lugar nem das vias de acesso a esse espaço que pudesse ser observado e descrito por qualquer ciência ou técnica, como se Jesus fosse um dos precursores dos astronautas. Basta de representações ridículas da fé. Na pregação, na catequese e na teologia, temos de reflectir sobre a linguagem que a Bíblia e o Credo cristão usam. As "leis" da linguagem simbólica, metafórica, parabólica, poética e narrativa existem para sugerir, dão que pensar, mas não obedecem a uma ligação circunscrita entre os significantes e os significados. Esse tipo de explicações mata a música da linguagem e não dá conta das transformações a que ela convida. A linguagem das transformações espirituais da existência não se lê nem se interpreta com um dicionário.

3.A Ascensão é a linguagem da fuga à manipulação política de Cristo pelas Igrejas. Jesus tinha vencido essas tentações, mas nunca estarão definitivamente resolvidas. Os Actos dos Apóstolos, a primeira história da Igreja, começam por essas permanentes ambições dos discípulos: "Senhor, será agora que ides restaurar a realeza em Israel?" (Act 1, 6). Cristo parece cansado com essa pergunta recorrente. Dissera tantas vezes que não veio ao Mundo para mandar, mas para servir a esperança e a transformação da vida e eles sempre na mesma... Agora, confessa que só o Espírito de Deus lhes poderá dar a volta e é o único dom que ele tem para a Igreja.
É também recorrente a pergunta: onde estarão as pessoas que amamos e morreram? Não aconselho ninguém a ir ao cemitério. Creio que estão no coração de Deus, a casa definitiva de todos. Se me perguntam onde é e como é, atrevia-me a dizer que é tão grande como o amor de Deus, tão invisível e presente como Ele. Não procuro outro Céu.

(1) Darwin y el Diseño Inteligente, Alianza, 2008.
(2) Sobre o debate sobre o "Desígnio Inteligente", cf. Francis S. Collins, A Linguagem de Deus, Lisboa, Presença, 2007





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