Anselmo Borges: Jesus não era cristão?
Infelizmente, entre nós, o saber sobre a religião e as religiões é primário. A razão está em que o estudo do fenómeno religioso tem estado ausente da Universidade. Depois, há alguma má vontade, por vezes justificada, contra a Igreja, e esta não se tem esforçado suficientemente para esclarecer os cristãos e as pessoas em geral.
Afinal, em que ficamos: Jesus era cristão ou não? Se por cristão entendermos um discípulo de Jesus Cristo, então Jesus não era cristão, pois ele não foi discípulo de si mesmo. Se entendermos por cristão aquele movimento histórico que chegou até nós com esse nome e que tem na sua base a fé em Jesus, o Cristo, então Jesus era cristão, na medida em que a sua pessoa e o que ele anunciou e fez constituem o fundamento do cristianismo. Foi em Antioquia, que, pelo ano 48, pela primeira vez, os discípulos receberam o nome de cristãos, como pode ler-se nos Actos dos Apóstolos.
Infelizmente, entre nós, o saber sobre a religião e as religiões é primário. A razão está em que o estudo do fenómeno religioso tem estado ausente da Universidade. Depois, há alguma má vontade, por vezes justificada, contra a Igreja, e esta não se tem esforçado suficientemente para esclarecer os cristãos e as pessoas em geral.
Deste modo se explica, como disse o reputado exegeta Padre Carreira das Neves, que investigou em Jerusalém e em Roma, em bibliotecas com centenas de milhares de volumes dedicados ao tema, tendo ele próprio uma pequena biblioteca de três mil volumes, que chegue José Rodrigues dos Santos e qual Pitonisa de Delfos pense arrumar a questão com dezoito volumes. Não é bom não se cumprir o velho preceito: que o sapateiro não vá além da sandália.
Tenho repetido que, sendo Jesus a figura mais estudada da história por especialistas eminentes, que dedicaram e dedicam a sua vida ao tema, se José Rodrigues dos Santos julga ter encontrado a verdadeira identidade de Jesus Cristo, deveria escrever um artigo científico ou uma tese e deixar-se confrontar então com os seus pares, e o seu nome ficaria inapagável na lista da investigação. O que não pode é jogar ao mesmo tempo nos dois tabuleiros: o ficcional e o histórico-teológico, pois isso é desonesto intelectualmente, já que o leitor não tem maneira de destrinçar entre os dois planos. Quando é que é história? Quando é que é ficção?
O Novo Testamento contém muitas "fraudes", pois não existem originais, diz ele. Que diríamos então das obras da Antiguidade Clássica, da Ilíada, da Odisseia, das obras de Platão? Em relação ao Novo Testamento, há uns 115 papiros com quase todo o seu texto, dos séculos II e III, e um fragmento do capítulo 18 do Evangelho de João foi escrito pelo ano 125 e é praticamente idêntico ao que editamos hoje a partir de manuscritos posteriores. O cânone, no essencial, estava estabelecido pelo ano 200.
Por mim, apresentei o livro, no contexto do que deve ser uma apresentação: um diálogo crítico com a obra e o autor. Os jornais referiram a minha crítica e discordância. A RTP, essa, limitou-se a dizer - intencionalmente? - que eu o tinha apresentado. Como a minha crítica não foi sequer mencionada - José Rodrigues dos Santos, pelo contrário, teve espaço amplo de divulgação do seu livro, até no telejornal, o que levou ao protesto de muitos, perguntando se não se está a ferir a norma da imparcialidade de uma televisão que deve ser serviço público -, muita gente pensou que eu tinha ido a Lisboa abençoá-lo. Afinal, não é sem razão que há quem se queixe do abuso do poder dos jornalistas, concretamente na televisão.
De qualquer forma, esta polémica revela que Jesus continua a ser uma figura apelativa, que exerce fascínio. Mesmo "O Último Segredo" quer clonar Jesus, porque seria factor de paz para o mundo.
Quer se queira quer não, o Natal existe por causa de Jesus Cristo. Ele é uma figura determinante da História, que, sem ele, seria diferente. Como escreveu o filósofo ateu Ernst Bloch, foi por ele que veio ao mundo a afirmação de que todos os seres humanos têm dignidade inviolável. Aliás, a própria ideia de pessoa e dos seus direitos tem na base a discussão à volta da sua pessoa. Jesus está na origem da religião maioritária no mundo. Numa população mundial, calculada em 6900 milhões, há 2180 milhões de cristãos: uma em cada três pessoas no mundo é cristã.
in DN
Infelizmente, entre nós, o saber sobre a religião e as religiões é primário. A razão está em que o estudo do fenómeno religioso tem estado ausente da Universidade. Depois, há alguma má vontade, por vezes justificada, contra a Igreja, e esta não se tem esforçado suficientemente para esclarecer os cristãos e as pessoas em geral.
Afinal, em que ficamos: Jesus era cristão ou não? Se por cristão entendermos um discípulo de Jesus Cristo, então Jesus não era cristão, pois ele não foi discípulo de si mesmo. Se entendermos por cristão aquele movimento histórico que chegou até nós com esse nome e que tem na sua base a fé em Jesus, o Cristo, então Jesus era cristão, na medida em que a sua pessoa e o que ele anunciou e fez constituem o fundamento do cristianismo. Foi em Antioquia, que, pelo ano 48, pela primeira vez, os discípulos receberam o nome de cristãos, como pode ler-se nos Actos dos Apóstolos.
Infelizmente, entre nós, o saber sobre a religião e as religiões é primário. A razão está em que o estudo do fenómeno religioso tem estado ausente da Universidade. Depois, há alguma má vontade, por vezes justificada, contra a Igreja, e esta não se tem esforçado suficientemente para esclarecer os cristãos e as pessoas em geral.
Deste modo se explica, como disse o reputado exegeta Padre Carreira das Neves, que investigou em Jerusalém e em Roma, em bibliotecas com centenas de milhares de volumes dedicados ao tema, tendo ele próprio uma pequena biblioteca de três mil volumes, que chegue José Rodrigues dos Santos e qual Pitonisa de Delfos pense arrumar a questão com dezoito volumes. Não é bom não se cumprir o velho preceito: que o sapateiro não vá além da sandália.
Tenho repetido que, sendo Jesus a figura mais estudada da história por especialistas eminentes, que dedicaram e dedicam a sua vida ao tema, se José Rodrigues dos Santos julga ter encontrado a verdadeira identidade de Jesus Cristo, deveria escrever um artigo científico ou uma tese e deixar-se confrontar então com os seus pares, e o seu nome ficaria inapagável na lista da investigação. O que não pode é jogar ao mesmo tempo nos dois tabuleiros: o ficcional e o histórico-teológico, pois isso é desonesto intelectualmente, já que o leitor não tem maneira de destrinçar entre os dois planos. Quando é que é história? Quando é que é ficção?
O Novo Testamento contém muitas "fraudes", pois não existem originais, diz ele. Que diríamos então das obras da Antiguidade Clássica, da Ilíada, da Odisseia, das obras de Platão? Em relação ao Novo Testamento, há uns 115 papiros com quase todo o seu texto, dos séculos II e III, e um fragmento do capítulo 18 do Evangelho de João foi escrito pelo ano 125 e é praticamente idêntico ao que editamos hoje a partir de manuscritos posteriores. O cânone, no essencial, estava estabelecido pelo ano 200.
Por mim, apresentei o livro, no contexto do que deve ser uma apresentação: um diálogo crítico com a obra e o autor. Os jornais referiram a minha crítica e discordância. A RTP, essa, limitou-se a dizer - intencionalmente? - que eu o tinha apresentado. Como a minha crítica não foi sequer mencionada - José Rodrigues dos Santos, pelo contrário, teve espaço amplo de divulgação do seu livro, até no telejornal, o que levou ao protesto de muitos, perguntando se não se está a ferir a norma da imparcialidade de uma televisão que deve ser serviço público -, muita gente pensou que eu tinha ido a Lisboa abençoá-lo. Afinal, não é sem razão que há quem se queixe do abuso do poder dos jornalistas, concretamente na televisão.
De qualquer forma, esta polémica revela que Jesus continua a ser uma figura apelativa, que exerce fascínio. Mesmo "O Último Segredo" quer clonar Jesus, porque seria factor de paz para o mundo.
Quer se queira quer não, o Natal existe por causa de Jesus Cristo. Ele é uma figura determinante da História, que, sem ele, seria diferente. Como escreveu o filósofo ateu Ernst Bloch, foi por ele que veio ao mundo a afirmação de que todos os seres humanos têm dignidade inviolável. Aliás, a própria ideia de pessoa e dos seus direitos tem na base a discussão à volta da sua pessoa. Jesus está na origem da religião maioritária no mundo. Numa população mundial, calculada em 6900 milhões, há 2180 milhões de cristãos: uma em cada três pessoas no mundo é cristã.
in DN